Camilo Ferreira Botelho Castelo Branco nasceu em Lisboa a 16 de março de 1825. Filho de Manuel Joaquim Botelho Castelo Branco e de Jacinta Rosa do Espírito Santo Ferreira, Camilo foi registado como filho de mãe incógnita, pelo que se diz, porque o seu pai e a sua avó não queriam que o nome Castelo Branco estivesse envolvido com alguém de tão humilde condição. A morte do pai obrigou-o a ir viver para Trás-os-Montes. Como era uma criança sensível e muito inteligente, sofreu grandes perturbações com todos os acontecimentos da sua infância. Ao longo da sua existência, revelou-se um falhado nos estudos e nos amores. As vicissitudes da vida fazem-lhe despoletar a ideia de que a fatalidade e a desgraça são destinos a que não pode escapar. Foi um profissional das letras multifacetado, cuja obra o posicionou com uma das figuras mais eminentes da literatura portuguesa. Apaixona-se por Ana Augusta Vieira Plácido. Ana Plácido era uma mulher casada mas Camilo consegue seduzi-la. Fogem os dois mas acabam por serem capturados e julgados pelas autoridades acabando por serem enviados para a Cadeia da Relação do Porto, onde Camilo escreve a obra Amor de Perdição. O caso de Ana Plácido e de Camilo Castelo Branco emocionou a opinião pública, pelo seu conteúdo tipicamente romântico de amor contrariado. Suicidou-se a 1 de junho de 1890, na freguesia de Ceide, Vila Nova de Famalicão.
Amor de Perdição
- Título e Subtítulo
Amor de Perdição tem como subtítulo Memórias de uma família. De facto, o autor narra episódios da família Correia Botelho, ou seja, muitas das situações vividas pelo escritor e pela sua própria família. Os seus fundamentos são históricos, embora não se possa determinar com exatidão até onde vai a verdade histórica e onde começa a fantasia. Simão Botelho existiu na realidade. Por detrás dele, tio de Camilo, o próprio escritor apaixonado e desequilibrado.
- Espaço e tempo
O espaço físico, em Amor de Perdição, conhece um afunilamento progressivo à medida que a acção trágica se encaminha para o seu clímax e, posteriormente, para o desenlace final. Assim, de um espaço amplo exterior onde as personagens evoluem livremente, passa-se para um espaço fechado e reduzido onde as personagens são encarceradas. Este espaço reduzido simboliza a prisão da própria vida, visto que estão enclausuradas na dimensão da própria tragédia.
O tempo da obra é caracterizado como diegético. Na introdução, abarcam-se 40 anos, são os antepassados de Simão.
A acção decorre em 6 anos (1801 - 1807):
· 1801, Domingos Botelho corregedor em Viseu, Simão tem 15 anos.
· 1803, Teresa escreve uma carta a Simão, revelando as intenções de seu pai de a enviar para um convento.
· 1804, Simão é preso.
· Prisão de Simão de 1805 a 1807. Antes de embarcar para o degredo, fica 20 meses na prisão.
· 17/3/1807, Simão parte para a Índia.
· 28/3/1807, ao romper da manhã, Simão morre.
· tempo do discurso (forma como o narrador elabore o seu relato).
O narrador segue a cronologia acima apresentada, narrando de forma cronológica os acontecimentos.
- Linguagem, estilo e estrutura da obra
O livro de Camilo é rico em cartas entre Simão e Teresa. O discurso epistolar contém uma linguagem emotiva, apelativa, exclamativa e expressiva. As cartas têm frequentemente frases curtas e vocativos, como “Não receies nada por mim, Simão.”
O livro também é rico em diálogos e adjetivos. Os adjetivos estão presentes em todas as fases do romance: “faca pavorosa”, “luz mortiça da lâmpada”, “amor discreto e cauteloso”.
A frase “Amou, perdeu-se e morreu amando” pode ser utilizada para sintetizar a obra Amor de Perdição da seguinte maneira: “Amou” representa a introdução da obra, onde faz referência a dados biográficos do Camilo e a apresentação global do infortúnio de Simão Botelho. “perdeu-se”, correspondendo ao desenvolvimento da obra que vai do capítulo I até ao capítulo XX. Ocorrem vários factos como a paixão entre Teresa e Simão. Por fim, “morreu amando”, reenvia para o desfecho da obra com a morte trágica de Simão e o suicido de Mariana.
- Narrador e Narratário.
Podemos caracterizar o narrador como heterodiegéitico, é apenas considerado narrador e não personagens pois este não participa na ação acabando por recorrer á terceira pessoa gramatical. É omnisciente pois tem conhecimento de tudo o que se passa com a história e com as personagens.
- Simão: o narrador da obra na introdução faz uma caracterização de Simão. Este passa a dizer: “Simão António Botelho, que assim disse chamar-se, ser solteiro e estudante na universidade de Coimbra, natural da cidade de Lisboa(…) filho de Domingos José Correia Botelho e de D. Rita Preciosa Caldeirão Castelo Branco; estatura ordinária, cara redonda, olhos castanhos, cabelo e barba preta, vestido com jaqueta de baetão azul, colete de fustão pintado e cala de pano pedrês.” Após a visão de Teresa, Simão transforma-se: distancia-se da ralé de Viseu; torna-se caseiro; cumpre os seus deveres de estudante; passeia pelo campo, procurando o espaço natural, em detrimento do espaço social. Mas quando Teresa é obrigada a sair da janela, local onde via Simão e, posteriormente, quando lhe comunica o desejo do seu pai de que ela se case com o seu primo Baltasar, Simão revela-se de novo rebelde. A par desta faceta, irá porém surgir uma outra: a sua nobreza de alma, que se manifesta no momento em que deseja poupar um dos criados de Baltasar, que tentara matar Simão, pelo facto de o homem se encontrar ferido.O seu sentimento exacerbado de honra é também notável – ele manifesta-se pelo facto de Simão enfrentar sempre aqueles que se lhes opõem, pelo facto de se ter negado a fugir, depois de ter morto Baltasar, em legítima defesa, e ainda por recusar qualquer ajuda da família, aceitando a sua condenação à forca e, depois, ao degredo. O seu código de honra conduzi-lo-á, em última análise, à sua tragédia.O sentimento de dignidade é, por outro lado, inseparável da possibilidade de realização do seu amor – é assim que Simão não acede ao pedido de Teresa, para que cumpra os dez anos de pena, em Portugal, na cadeia.
- Teresa: Teresa representa um tipo vulgar na galeria feminina das heroínas românticas do tempo: amorosa angelical, vítima indefesa num mundo que não lhe pertence, porque organizado para servir apenas o egoísmo arbitrário dos homens, é um ente sensível, frágil, tendencionalmente incorpóreo votado pela fatalidade para o deperecimento e a aniquilação. Mas essa sua personalidade ganha certa força na alternância desta fraqueza com uma também sua própria vocação para morrer insubmissa. É que no fundo nada consegue deter a determinação a que se entrega. “A desgraça não abala a minha firmeza, nem deve intimidar os teus projectos.” – escreve ela a Simão.
- Mariana: Mariana é a figura mais humana e mais complexa da obra. Mariana é vista como um símbolo de gratidão desinteressada: é a enfermeira sempre vigilante do filho do desembargador Domingos Botelho que salvara seu pai da forca. É um símbolo de generosidade discreta e delicada, pois dá ao hóspede bens pessoais, cuidava do preso com abundância e limpeza, e a todos dizia que ali estava por ordem e à custa da senhora D. Rita Preciosa. Mariana como um símbolo de amor humilde, puro: contenta-se com amar sem ser amada, fazendo do amor um serviço gratuito, uma dádiva prestada sem quaisquer esperanças de reciprocidade.
- Baltasar Coutinho: Baltasar vive na dupla função para que o autor o criou: ser, por um lado, uma simples peça dinâmica da intriga; por outro, surgir, pelos defeitos que encarna (covardia, perversão pelo interesse do sentimento amoroso, cinismo, vaidade, desdém), como elemento contrastante de Simão, cujas qualidades e simpatia avultam neste jogo de oposições intencionais.
- Tadeu de Albuquerque e Domingos Botelho: Estas duas personagens não diferem fundamentalmente uma da outra, como símbolos que são de pais despóticos, cuja autoridade se escuda por detrás de princípios morais de tónica puramente formal, já que sempre traem este ou aquele interesse pessoa mesquinho, manipuladores arbitrários que são de pessoas e instituições pela força do dinheiro, da pressão hierárquica e das relações comprometidas. Tadeu é figura mais conseguida que a de Botelho – sobretudo quando, para o fim da história, Camilo o descreve com os olhos encovados a reverem o suor e o sangue de uma raiva que pedia debalde vingança.
- João da Cruz: O ferrador ergue-se, ainda sobre o esqueleto do bom bandido, tão caro a ficção ultra-romântica, que Camilo nele de certo modo e insinua e absolve na apóstrofe com que comenta a morte do generoso protetor de seu tio paterno. Mas a carne que veste esqueleto é viva – e tão naturalmente viva, que até a função dinâmica para que o narrador criou a figura se perde e apaga.
- D. Rita:representa a convencionalidade do sentimento materno – age mais por obrigação familiar do que por motivos afetivos; ajuda Simão porque esse é o seu papel e não porque o amor de mãe a leve a perdoar e a compreender as atitudes do filho.
- Ritinha: distingue-se das outras irmãs de Simão pela sua capacidade afetiva erepresenta, para Simão, o único laço familiar genuíno, porque é conduzida por aquilo que sente e não pelas convenções que lhe são impostas. A sua ligação a Simão leva-a a ser ela a relatora da sua história ao autor da obra, quando este era criança.
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